Por Valter da Silva Cardoso
Jornada I
No momento em que se escreve esta seção da Revista Quase-Ciências, o Brasil e o mundo parecem respirar aliviados em relação à pandemia de Covid 19 que, desde o início de 2020, assola a humanidade com seus efeitos nefastos sobre o cotidiano – dor, perda, morte, insegurança parecem ter invadido a vida das pessoas de modo inescapável. Mas, se, por um lado, com o avanço das vacinas e as boas práticas profiláticas, vê-se finalmente ressurgir a esperança de que a pandemia pode ser superada em futuro não muito distante, por outro, há que se promover a reflexão e compreensão desse processo – principalmente na perspectiva teórica adotada pelo GECCE, isto é, a dos Estudos Culturais, Estudos Culturais da Ciência e outras correntes de pensamento afins.
É preciso reconhecer que, por vezes, a história e a filosofia, bem como as demais ciências sociais, não têm nada a dizer[1]. Assim fizeram Lachenal e Thomas, ainda em março de 2020, no seu artigo “Covid 19: when history has no lesson”[2]. Mesmo porque o estado de estupor diante do perigo obriga a buscar no passado exemplos e lições para o presente, no entanto “the ‘lessons of the past’ were known by heart and yet it is hard to overstate how unprepared they left us”[3] (LACHENAL; THOMAS, 2020). Mas, passado algum tempo da pandemia, algumas publicações marcaram espaço e têm elementos a oferecer para a reflexão da crise. Neste sentido, o professor Gustavo Lins Ribeiro, do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Brasília, elaborou uma reflexão interessante sobre a pandemia de Covid 19 como um evento crítico – isto é, um acontecimento extraordinário, capaz de evidenciar aspectos das relações sociais, deixando à mostra suas contradições de caráter político, econômico e social – além de obrigar os agentes sociais a redimensionar suas expectativas em relação ao futuro. Tendo tomado essa categoria da antropóloga hindu Veena Das, Ribeiro aponta que ela se constitui em situação limite capaz de romper rotinas, tornando o amanhã algo incerto, já que a pandemia produziu um rompimento “[...] en la continuidad temporal de la reprodución de la vida, [provocando] la ausencia de sentidos adecuados para comprender la nueva situación y la necesidad de crear nuevos modelos interpretativos[4]” (RIBEIRO, 2021, p. 108).
Ainda no sentido de oferecer caminhos reflexivos para o surto pandêmico, a revista Cultural Studies lançou, em maio último, um volume especial com reflexões especificamente voltadas ao caos causado pelo coronavírus em todo o planeta. Já no seu artigo de introdução, provoca o questionamento sobre qual a necessidade dos Estudos Culturais em meio ao pesadelo que se instala por meio da pandemia. Pesquisadores do mundo todo procuraram atender a tal provocação. A partir dos artigos publicados, o volume oferece reflexões que vão, ao menos, por três linhas de pensamento. Os quadros interpretativos incluem
(…) the articulation of a cultural lifeworld of the pandemic (in a conscious attempt to connect with the lessons about the force of signification and public political deliberation learned from other pandemics, especially global AIDS); the manner in which COVID has been weaponized in government manoeuvres and in virulent forms of racialization; and the affective and bodily registers that mark our collective vulnerability. In this mapping, COVID multiplies semantically, politically, and corporeally. It is hoped that this Special Issue provides not only a sort of memory archive for what the world has gone through in 2020–21, but also hopefully some intellectual guidance for the way forward[5] (ERNI; STRIPHAS, 2021).
Outra iniciativa importante nesta linha foi a do European Journal of Cultural Studies, que ainda em 2020 criou uma seção especial, a Cultural Commons, para oferecer reflexões que permitissem uma melhor compreensão sobre a crise da Covid 19. Há que se dar destaque à reflexão que propõe ter a pandemia potencializado a controversa noção de pós-verdade, criando ambiente propício para que se disseminasse “(…) a certain form of aggressive (masculine and white), ruggedly individualist truth-telling, its false statements, its historical causes, and mortal effects could become so spectacularly impactful at a particular point in time, in particular places[6]” (HARSIN, 2020). Outro estudo que merece atenção na citada seção é o que discute a disseminação do fenômeno do Tik Tok. A reflexão vai no sentido de que a mídia social, para além de uma visão inocente e celebrativa da infância, durante o período de isolamento da pandemia pode vir a contribuir para transformar o espaço do quarto das meninas “(…) from a space previously conceptualised as private and safe from judgement, to one of public visibility, surveillance and evaluation[7]” (KENEDY, 2020).
Entre as publicações brasileiras, é possível citar o e-book organizado pela pesquisadora mato-grossense Michèle Sato (2020), “Os condenados da pandemia”. A publicação apresenta um panorama dos grupos que, durante a pandemia, adentraram ou se viram no perímetro da vulnerabilidade. Faz-se a denúncia de uma suposta democracia da pandemia, que na realidade apenas mascara que as mortes são marcadas por um infame recorte de classe[8]. Isto porque, se todos podem ser vítimas do contágio, a morte parece vir com mais frequência para aqueles já fragilizados pela fome – e estes, sempre têm sobre si a marca da raça, da classe e do gênero (BUTLER; 2020).
Para finalizar esta jornada é preciso indicar dois papers sobre teorias da conspiração[9]. O primeiro aponta que elas podem ser vistas como fenômeno cultural popular e contemporâneo – muitas vezes tomadas como fruto de crenças irracionais e/ou má ciência. Porém, uma perspectiva que queira alcançar uma interpretação sociológica dos fenômenos culturais, será cautelosa e evitará acusações a priori sobre tais fatos controversos. Do contrário, em vez de análise empírica acabará por produzir considerações de ordem moral – calcadas mais em ideias preconcebidas acerca da ciência e da sociedade do que nos fatos que quer analisar (HARAMBAM; AUPERS. 2014). Nesta linha, é que se apresenta o estudo que problematiza as diversas narrativas mobilizadas pelo presidente Jair Bolsonaro, bem como seus seguidores, durante a pandemia de Covid 19[10]. Os autores do estudo partem da perspectiva metodológica conhecida como mapeamento de controvérsias, que pretende estudar momentos de efervescência, conflito, crise, desestabilização ou ruptura (KALIL et al., 2021). Para entender essas possíveis tramas conspiratórias, buscam então, seguir a trajetória de ação dos atores envolvidos, considerados não a partir de juízos de valor, mas da situação social em que estão postos. Os resultados do trabalho esmiúçam a complexidade do horizonte histórico brasileiro, indo além das narrativas que opõem racionalidade e obscurantismo. Expressam o poder conspiratório das mídias sociais neste contexto, mas sem resvalar para análises dicotômicas ou simplistas. Assim, longe de apontar discursos moralistas sobre o papel da verdade e da ciência, querem entender a trama que o medo permite traçar no sistema de crenças de uma população assolada pelo coronavírus. Mesmo que o estudo não seja afiliado à perspectiva dos Estudos Culturais, está em conformidade com a ideia de desenvolver compreensão maior sobre as articulações e assimetrias que se estabelecem no espaço entre ideologia e cultura (HALL, 2003). Teorias da conspiração não podem ser circunscritas a questões isoladas e postas a priori. Longe disso, localizam-se em um horizonte cultural complexo – enredadas que estão a práticas, tradições e políticas particulares.
Jornada II
Nesta segunda jornada do Turismo, num primeiro momento será apresentada a iniciativa do Internacional Journal of Cultural Studies (disponível no Portal de Periódicos da CAPES), que busca problematizar e tencionar o campo de atuação dos Estudos Culturais, propondo a questão “o que são os Estudos Culturais?[11]”. Vários pesquisadores, de diversas partes do globo se dispuseram a refletir sobre a proposição, e têm-se como resultado talvez mais perguntas do que respostas, pois os Estudos Culturais “(…) does not claim to specialize itself in a circumscribed object of study. Instead, cultural studies scholarship can roam across the whole landscape of the contemporary world, focusing on any particular issue or topic deemed relevant at a given time and place[12]” (ANG, 2020, p. 286). Em seguida, a proposta será voltar o olhar para as interfaces possíveis entre os Estudos Culturais e a Educação. Para tanto, primeiro será tomado um estudo que realiza um rastreamento de pesquisas voltadas à natureza, bem como às temáticas indígenas e afro-brasileiras que se produzem na linha de Pesquisa dos Estudos Culturais do Programa de pós-graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul[13]. A partir do contexto apresentado pelo artigo, o leitor terá acesso aos deslocamentos teórico-metodológicos, assim como no olhar e sensibilidade para pesquisa, ocorridos no decorrer do tempo no âmbito dos Estudos Culturais naquela instituição – é possível vislumbrar itinerários fluidos, flexíveis e difusos que inspiraram trabalhos que se dispuseram a tratar de temas como educação ambiental e questões étnico-raciais, por exemplo. O artigo funciona como uma bússola, que, mesmo não apontando para paragens calmas e tranquilas, permite navegar por inquietações e instabilidades características da pesquisa em Estudos Culturais (BONIN et al., 2020).
Ainda pensando interfaces entre Estudos Culturais e Educação, volta-se agora ao contexto dos Estudos Culturais da Ciência – mais precisamente, das possibilidades de uso da História da Ciência para o Ensino de Ciências. O contexto é o Leste da Ásia, mais especificamente a República da Coreia. O estudo faz referência à quase inexistente utilização de Histórias não-Ocidentais da Ciência para o Ensino de Ciências. Os autores então propõem o uso de elementos da História da ciência do Leste Asiático no contexto da formação de professores de Ciências – tomando para isso estudos pós-coloniais de Ciências e história global da Ciência. Propõem investigar a percepção de professores de formação inicial em relação à forma como veem a produção científica, tanto no Ocidente quanto no Leste da Ásia. Para tanto, usam ensaios reflexivos, palestras, vídeos, aulas especiais e entrevistas. Os resultados apontam que, como cidadãos coreanos e professores, os participantes do estudo consideram extremamente relevante o uso de elementos da História da Ciência do Leste Asiático na formação de estudantes. Porém, como professores especificamente ligados ao Ensino de Ciências, tendem a minimizar a importância de tais práticas, uma vez que elas não fazem parte da ciência moderna. De qualquer forma os professores que participaram da pesquisa relataram que ela consistiu em “[…] an opportunity to critically reflect on science education and their responsibility as teachers in the context of broader society and culture[14]” (PARK; SONG, 2021).
Jornada III
Nesta terceira e última jornada do turismo, o foco irá recair sobre a prisão e a segregação social. Se este texto teve início com reflexões sobre a pandemia, que acabou por confinar boa parte dos habitantes do planeta em suas casas, chega a sua última seção procurando pensar a instituição criada para ser o protótipo dos processos de segregação social e internalização da disciplina. A privação de liberdade, seja em termos literários, seja em termos acadêmicos, sempre foi um tema que conduziu o ser humano a refletir sobre sua condição. Afinal, a liberdade e sua ausência são questões antropológicas de peso. Isso se torna mais interessante quando se reflete, a partir de Foucault, que a sociedade escolhe aqueles que irá privar de liberdade. O texto[15] que abre esta jornada trata de histórias de mulheres aprisionadas (GOMES; DE MATTIA; CAMOZZATO, 2021). Estas têm em comum o processo de marginalização perpetrado por um sistema que as encarcera e lhes rouba a voz – além da prisão, são encarceradas no estereótipo da marginalidade. Tomando de Foucault o expediente das narrativas de si, o artigo apresenta fragmentos do diário de duas detentas, restaurando-lhes agência e voz. O trabalho tem resultados impactantes, inclusive porque opta por apresentar os relatos das participantes transcritos exatamente da maneira como foram escritos por elas – sem correções, exatamente como forma de realçar que a escolaridade das aprisionadas é um ponto a ser considerado. Traduzir para outra forma de linguagem seria trair estes atores inscritos em gêneros, raças, classes sociais e gerações tão específicos.
O segundo texto desta jornada, apesar de não tratar especificamente da prisão, tangencia esse tema ao abordar o controle do espaço – isto é, da segregação social. O texto[16], ao abordar processos de gentrificação[17] - promovendo o controle do espaço por meio de uma arquitetura hostil – permite refletir que os grandes centros têm atuado estrategicamente “[…] de forma a diminuir o espaço público, material e imaterial, permitindo que estruturas privadas avancem sobre o espaço de uso e de propriedade pública” (FARIA, 2020). Cada vez mais então, o público se torna privado, e a livre circulação se torna restrita a parcelas específicas do espectro social. As estratégias hostis serão demandadas de acordo com o local e público que se quer proteger ou afastar - mesas de restaurantes privados são colocadas nas calçadas, impedindo a livre circulação no espaço público. Pinos e espetos são instalados pelo lado de fora das soleiras e vitrines, com o intuito de impedir que cidadãos se sentem ou passem a noite. Flores com espinhos são cultivadas para afastar indesejáveis de uma fachada. A criatividade humana será acionada para que se possa ter, por meio do espaço, controle da vida e dos corpos. O resultado é a impermeabilização da cidade, possibilitando o desejado controle e segregação social.
Referências
AGAMBEN, Giorgio et al. Sopa de Wuhan: pensamiento contemporáneo en tiempos de pandemias. Madrid: ASPO, 2020.
AGAMBEN, Giorgio. Contagio. In: AGAMBEN, Giorgio et al. Sopa de Wuhan: pensamiento contemporáneo en tiempos de pandemias. Madrid: ASPO, 2020. p. 31-33.
ALCÂNTARA, Maurício F. Gentrificação. Enciclopédia de Antropologia. F.F.L.C.H. USP. São Paulo. Disponível em: https://ea.fflch.usp.br/conceito/gentrificacao. Publicado em: 03/07/2018. Acesso em: 15/09/2021.
ANG, Ien. On Cultural studies, again. International Journal of Cultural Studies. (S. L.). Volume 23, number 3, May 2020. p. 285-291.
BONIN, Iara T.; RIPOLL, Daniela; WORTMANN, Maria L. C.; SANTOS, Luis H. S. Por que estudos culturais? Educação & Realidade. Porto Alegre, v. 45, n. 2, p. 1–22, 2020.
BUTLER, Judith. El capitalismo tiene sus limites. In: AGAMBEN, Giorgio et al. Sopa de Wuhan: pensamiento contemporáneo en tiempos de pandemias. Madrid: ASPO, 2020.p. 59-65.
ERNI, John N.; STRIPHAS, Ted. Introduction: COVID-19, the multiplier. Cultural Studies. Reino Unido. Volume 35, Issue 2-3 (2021). Disponível em: https://www.tandfonline.com/toc/rcus20/35/2-3. Publicado em: 04/05/2021. Acesso em: 15/06/2021.
FARIA, Débora R. Sem descanso: arquitetura hostil e controle do espaço público no centro de Curitiba. Orientador: Alessandro Filla Rosaneli. Dissertação (Mestrado em Planejamento Urbano). Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2020.
GOMES, Juniélen V.; DE MATTIA, Jaqueline L.; CAMOZZATO, Viviane C. Entrelaçamentos entre Histórias de vida de mulheres aprisionadas: dar a palavra, aguçar a escuta. RELACult-Revista Latino-Americana de Estudos em Cultura e Sociedade, v. 7, n. 1, 2021.
HALL, Stuart. Da diáspora: identidades e mediações culturais. 2a reimp. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003.
HARSIN, Jayson. Toxic White masculinity, post-truth politics and the COVID-19 infodemic. On tag: Cultural Commons: critical responses to the COVID-19 crisis. European Journal of Cultural Studies. Europa. Disponível em: https://journals.sagepub.com/page/ecs/collections/covid-19. Publicado em: 08/08/2020. Acesso em: 15/09/2021.
KENEDY, Melanie. “If the rise of the TikTok dance and e-girl aesthetic has taught us anything, it’s that teenage girls rule the internet right now”: TikTok celebrity, girls and the Coronavirus crisis. On tag: Cultural Commons: critical responses to the COVID-19 crisis. European Journal of Cultural Studies. Europa. disponível em: https://journals.sagepub.com/page/ecs/collections/covid-19. Publicado em: 31/07/2020. Acesso em: 15/09/2021.
LACHENAL, Guillaume; THOMAS, Gaëtan. Covid-19: when history has no lesson. On Tag: Apocalypse Then and Now. History Workshop Online. Reino Unido. Disponível em: https://www.historyworkshop.org.uk/covid-19-when-history-has-no-lessons/. Publicado em: 30/03/2020. Acesso em: 15/09/2021.
PARK, Wonyong; SONG, Jinwoong. Looking back at “our science” and “our history”: an exploration of Korean preservice science teachers’ encounters with East Asian history of science. Cultural Studies of Science Education. (S. L.), Vol. 16, nº 2, julho de 2021. Disponível em: https://doi.org/10.1007/s11422-021-10060-w. Acesso em: 30/07/2021.
RIBEIRO, Gustavo L. “Descotidianizar” el mundo: a pandemia como evento crítico, revelaciones y sus (re)interpretaciones. Desacatos – Revista de Ciencias Sociales. Ciudad de México. n. 65, p. 106-123, enero-abril, 2021.
SATO, Michèle (Org.). Os condenados da pandemia. Cuiabá: GPEA-UFMT / Editora Sustentável, 2020.
ZIZEK, Slavoj. Coronavirus es un golpe al capitalismo al estilo de ‘Kill Bill’ y podría conducir a la reinvención del comunismo. In: AGAMBEN, Giorgio et al. Sopa de Wuhan: pensamiento contemporáneo en tiempos de pandemias. Madrid: ASPO, 2020. p. 21-28.
[1]Um exemplo disso é a coletânea de artigos Sopa de Wuhan: pensamiento contemporáneo en tiempos de pandemias, escrita por alguns dos intelectuais mais férteis do mundo contemporâneo e que, infelizmente, no caso de um ou outro, desenvolveram análises equivocadas sobre o horror pandêmico que, em março de 2020, se avizinhava – como, por exemplo, condenar o isolamento social ou considerar a pandemia uma conspiração capitalista (AGAMBEN et al., 2020). De qualquer forma, trata-se de um esforço intelectual consistente para promover a descrição e compreensão da experiência humana na pandemia, que, no momento em que seus textos foram escritos, ainda estava longe do vigor máximo que viria a atingir. Ao longo deste Turismo, voltar-se-á a algumas de suas ideias para melhor compreensão de alguns contextos vividos. [2]“Covid 19: quando a história não tem lições” (tradução livre). [3]“As ‘lições do passado’ eram conhecidas de cor, mas é difícil exagerar o quão despreparados elas nos deixaram” (tradução livre). [4]“(…) na continuidade temporal da reprodução da vida, provocando a ausência de significados adequados para compreender a nova situação e a necessidade de criar novos modelos interpretativos” (tradução livre). [5]“(…) a articulação de um mundo da vida cultural da pandemia (em uma tentativa consciente de se conectar com as lições sobre a força de significação e a deliberação de políticas públicas aprendidas com outras pandemias, especialmente a AIDS global); a maneira pela qual a COVID foi transformada em arma e instrumento para manobras governamentais, ou ainda, em formas virulentas de racialização; e os registros afetivos e corporais que marcam nossa vulnerabilidade coletiva. Nesse mapeamento, COVID se multiplica semanticamente, politicamente e corporalmente” (tradução livre). [6]“Uma certa forma agressiva (masculina e branca), rude e individualista de dizer a verdade, suas declarações falseadoras, apontando causas históricas que têm efeitos mortais, que se tornam espetacularmente impactantes em determinados períodos e lugares” (tradução livre). Aqui é possível recuperar a reflexão proposta por Zizek (2020), já que é possível perceber que uma gama de sentimentos ligados à barbárie, que pareciam sobreviver de forma latente sob uma capa de civilidade, esperavam um evento crítico como a pandemia para vir à tona e mostrar à humanidade sua pior face. [7]“(…) De um espaço previamente conceituado como privado e seguro de julgamento, para um espaço de visibilidade pública, vigilância e avaliação” (tradução livre). [8]Para alguns pensadores, mesmo antes do processo pandêmico, o capitalismo havia chegado ao limite de seus processos acumulativos e excludentes. Outro ponto que atesta sua falência estaria no fato de não poder evitar que seja revelada sua força predatória global, que inclusive expõe o planeta ao risco sanitário da produção de alimentos na escala das commodities. Sendo assim, a Covid 19 apenas revela que é impossível a manutenção deste sistema sem que radicais mudanças estruturais sejam impetradas (ZIZEK, 2020). [9]Indicados pelo pesquisador do GECCE Leonardo W. Soares de Melo. [10]Aqui tem-se um ambiente de crença em um perigo generalizado do qual um governo mal intencionado poderia tirar vantagem. Porém, operando de forma contrária à que Agamben (2020) defende em seu artigo, as forças de governo e seus aliados centraram fogo em outros inimigos: população LGBTQIA+, populações indígenas e quilombolas e, principalmente, aqueles com posicionamento político à esquerda – e não naqueles que poderiam ser portadores do vírus disseminador de doenças. De qualquer forma, tudo indica que o ambiente de medo e desconfiança generalizado tinha como objetivo permitir a implementação de medidas de exceção. [11]Artigos estão no volume 23 da revista (números 3, 4 e 6). [12]“[Os Estudos Culturais] não pretendem se especializar em um objeto de estudo circunscrito. Em vez disso, os estudos acadêmicos de estudos culturais podem percorrer toda a paisagem do mundo contemporâneo, com foco em qualquer questão ou tópicos específicos que sejam considerados relevantes em um determinado momento e lugar” (tradução livre). [13]Indicado pelo pesquisador do GECCE David Pereira Faraum Junior. [14]“[…] Uma oportunidade de refletir criticamente sobre a educação científica e sua responsabilidade como professores no contexto de uma sociedade e cultura mais amplas” (tradução livre). [15]Artigo Indicado pela pesquisadora do GECCE Susan Caroline Camargo. [16]Indicado pela pesquisadora do GECCE Cristine Lois Coleti Sierra. [17]O termo “refere-se a processos de mudança das paisagens urbanas, aos usos e significados de zonas antigas e/ou populares das cidades que apresentam sinais de degradação física, passando a atrair moradores de rendas mais elevadas. Os ‘gentrificadores’ (gentrifiers) mudam-se gradualmente para tais locais, cativados por algumas de suas características – arquitetura das construções, [...] infraestrutura, oferta de equipamentos culturais e históricos, localização central ou privilegiada, baixo custo em relação a outros bairros –, passando a demandar e consumir outros tipos de estabelecimentos e serviços inéditos. A concentração desses novos moradores tende a provocar a valorização econômica da região, aumentando os preços do mercado imobiliário e o custo de vida locais e levando à expulsão dos antigos residentes e comerciantes, comumente associados a populações com maior vulnerabilidade e menor possibilidade de mobilidade no território urbano, tais como classes operárias e comunidades de imigrantes” (ALCÂNTARA, 2018).
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