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Pensar culturas com E. P. Thompson: “como se faz um trabalho?”

Atualizado: 4 de nov. de 2021

Por Alexandre Luiz Polizel

 

Evidencia-se que caminhar pelos escritos de E.P. Thompson nos leva a uma construção de um cenário: a formação da classe operária. Entre a maldição de Adão ao situar as condições socioculturais, localizadas historicamente, o autor monta um palco para que em seu terceiro volume apresente sistematizadamente o surgimento da classe operária. Há neste sentido para Thompson um movimento analítico – do primeiro ao terceiro volume de sua obra, discutida no grupo – a analítica elaborada a partir de três cenários: a racionalidade/pensamento, as condições histórico-socioculturais e, a emergência da classe operária.

Vejo de certa forma, a fazer um paralelo com tal empreendimento de pensamento, que o Grupo de Estudos Culturais das Ciências e das Educações (GECCE-UEL) movimenta-se para pensar condições epistemológicas, histórico-culturais para a emergência de uma classe operária que se move em sua análise a pensar: Como lançar um olhar ao mundo para pensarmos uma analítica orientada pelos costumes comuns, das culturalidades, que tornam possível uma analítica cultural. Ou melhor, nas palavras de Valter: “Como se faz um trabalho [de óptica cultural]?”.

A questão colocada no GECCE a ser circularizada pelo terceiro volume de A Formação da Classe Operária Inglesa, coloca ao grupo a movimentar seu pensamento no entorno de como identificar os processos de emergência das ‘classes’, dos ‘agrupamentos’, das ‘alianças’, da possibilidade de ‘analisar as dinâmicas culturais’1.

A grande questão das discussões elaboradas e movimentadas a partir de Thompson (1987, p.322), se dá no entorno da compreensão de que

Nenhuma explicação isolada se conseguirá dar conta da profunda alteração dos hábitos dos trabalhadores.

A questão no grupo vai em consonância com tal apontamento que E. P. Thompson nos oferece em tal obra: são traçadas nas falas profundas tentativas de associar esta alteração dos hábitos dos trabalhadores, ou melhor dizendo, das derivações do modo de ser-estar-existir enquanto trabalhador, fazendo associações com a realidade sociocultural atual. Tocam-se em aspectos como ‘representação’, ‘pressões’, ‘jogos de forças’, ‘resistências’, ‘opressões’, ‘enfrentamentos’, ‘associações’, ‘agrupamentos’, ‘alianças’, ‘lutas’, ‘ludismos’... múltiplos são os conceitos associados, emergentes e articulados a partir do olhar para as formações da classe operária.

Vê-se que os membros do Grupo de Estudos Culturais das Ciências e das Educações colocam-se a elaborar links e associações com outros pensadores que não necessariamente são apresentados diretamente por E. P. Thompson, mas que a própria identidade do grupo busca colocar em diálogo com autor. Autores como Bruno Latour, Michel Foucault, Michel Serres, Karl Marx, Paulo Freire e Friedrich Engels são evocados para dialogar com o texto. Vejo que tais associações dão-se por múltiplas linhas de composição do GECCE e de seus encontros com o texto, demarco ao menos três: i) A identidade do Grupo estar ancorada em tais autores, e busca-se associar a tais para manutenção de uma identidade e posição de grupo; ii) Reconhece-se que quando voltamos o olhar aos Estudos Culturais, vê-se a possibilidade de colocar autores para conversar, desde que estes permitam que compreendamos em caráter de diversidade, heterogeneidade e ‘composicionismo’ para traçar analíticas da cultura; iii) Há a tentativa de criar pontes de dialogo com os autores tradicionais da fundação dos Estudos Culturais com leituras contemporâneas do mesmo.

São colocados em movimento a partir do texto o pensar acerca de: os não humanos nas formações de classes e balizas históricas e socioculturais, a revolução industrial e seus recortes no Brasil – da industrialização, desindustrialização, agronegócio e colonização (o que gerou efeitos nos modos pelos quais a classe trabalhadora se organizou no Brasil) –, os fluxos migratórios e a importação das culturas de resistências e enfrentamentos, a importância dos movimentos do ABC no Brasil (como representativo do cenário do fortalecimento da classe trabalhadora em insurgências em todo território nacional), dos ícones de representação das classe operária que emergem, bem como das torções e atravessamentos na formação da classe operária a partir das produções de saberes científicos e suas técnicas-tecnologias.

Evidencia-se que o GECCE toma o texto como uma base de possível ponto de situar-se enquanto grupo que irá discutir aspectos das Culturas, Ciências e Educações, contudo o enfoque dado pelo grupo neste encontro é o levantamento de questionamentos: ‘Vejo a questão do ludismo enquanto algo que nos convida a pensar os não humanos, o que acham?’, ‘A representação da figura do ex-presidente Lula, nos coloca a pensar como as máquinas atravessam os corpos dos trabalhadores? Como as ciências e químicas vão circulando e chegam ao Brasil?’, ‘Fico me perguntando como se faz um trabalho?”...

O grupo neste sentido e suas discussões podem nos auxiliar a compreender a formação da classe operária, compreendendo o próprio funcionamento e organização do GECCE: um grupo que transita entre as tradições e as reflexões contemporâneas; um grupo em que as questões levantadas são mais importantes e privilegiadas que as respostas (vê-se neste encontro pouquíssimas sistematizações conceituais, mas frequentemente o pensar a partir de um problema questões); um grupo que busca associar as leituras voltadas a pensar aspectos culturais, para traciona-las a refletir as ciências e educações; um grupo que pensa mais as ausências e lacunas do que produções; um grupo que busca a circulação de referencias ao invés da estratificação destas...


Referências


THOPSON, E.P. A formação da classe operária inglesa III: A força dos trabalhadores. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1987. Notas 1 A leitura de tal obra deu-se a partir de dois objetivos, preocupação, inquietação: conhecer as bases clássicas que compõe a emergência dos Estudos Culturais; e o conhecer aspectos relacionados às condições de surgimento dos Estudos Culturais e possibilidades de instrumentalização analítica.


Notas 1 A leitura de tal obra deu-se a partir de dois objetivos, preocupação, inquietação: conhecer as bases clássicas que compõe a emergência dos Estudos Culturais; e o conhecer aspectos relacionados às condições de surgimento dos Estudos Culturais e possibilidades de instrumentalização analítica.

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